26 julho 2018

67. A CAVERNA, O MONGE E A ESPIRITUALIDADE



Maria Clara Bingemer - teóloga, professora do Departamento de Teologia da PUC-Rio e autora de “Simone Weil – Testemunha da paixão e da compaixão” (Edusc).
Para quem anda descrente da humanidade, o recente episódio do resgate de doze adolescentes tailandeses de uma caverna inundada foi uma bela surpresa.  Uma onda de solidariedade se fez presente de um ponto a outro do planeta.  
Uma corrente de desejos e sentimentos positivos apontava de todas as partes na direção da caverna onde os meninos e seu treinador estavam confinados. O heroísmo de tantos, que vieram de outros países para ajudar no salvamento, foi admirável. Em época tão conturbada como a que vivemos, trata-se de um autêntico reencontro da humanidade consigo mesma, como disse a acadêmica Rosiska Darcy de Oliveira em recente artigo. 
Os doze meninos e seu treinador permaneceram na caverna onde as fortes inundações os surpreenderam isolados por longos dias com comida escassa e em condições muito precárias. Quando foram encontrados, o mundo inteiro ficou impressionado por estarem em boas condições físicas naquela situação limite que viviam.  Mas, para além disso, chamaram mais ainda a atenção de todos pela calma e equilíbrio que demonstraram durante todo o processo de encontro, resgate e salvamento.
De um grupo de adolescentes que formavam um time de futebol seria normal esperar medo, pânico e agitação ao se perceberem confinados em uma caverna escura por vários dias, sem saber como fazer para sair dali e salvar-se.  A insegurança, aliada à escassez de recursos alimentícios e à exiguidade do espaço seco em meio à caverna alagada, tudo contribuía para que os meninos estivessem abalados e vulneráveis.
No entanto, o que se viu foi um grupo de crianças calmas, vivendo a dificuldade pela qual passavam com um sorriso nos lábios e muita serenidade. Nenhum chorava ou tinha qualquer reação de angústia e aflição. E assim permaneceram ao longo de toda a operação de resgate com muita expectativas e adiamentos sem fim. 
Qual o segredo dessa paz, desse equilíbrio?  Que espírito adejava por aquela caverna a ponto de conseguir tranquilizar desta maneira doze crianças em perigo? Cremos que a resposta se encontra em algo que acompanha o ser humano desde suas origens e que ao longo da história tomou formas e configurações diversas e fascinantes: a espiritualidade.  Ou seja, a capacidade do ser humano de elevar-se além do sensorial e do racional, e experimentar a transcendência. 
No caso do time dos “Javalis Selvagens” que comoveu o mundo, parece que a fonte imediata daquele enfrentamento admirável de uma situação tão adversa encontra sua raiz na pessoa do treinador Ekapol Chanthawong. Foi ele quem os levou à excursão que acabaria isolando-os dentro da caverna.  Mas foi igualmente ele que os liderou no processo de resistência que lhes permitiu conservar a vida e as energias, de modo que pudessem ser salvos e reconduzidos a suas famílias. 
O treinador,  antes de ocupar-se de times de futebol,  foi monge budista e viveu desde os doze anos em um mosteiro.  Dali saiu para cuidar de sua avó doente. Ali também aprendeu as técnicas e o método da meditação budista durante uma década.  E quando saiu, levou consigo a espiritualidade que havia vivido no mosteiro. O mosteiro ficou gravado em seu interior  e o faz até hoje manter contato com a comunidade que ali reside. Segundo o abade do mosteiro, Chanthawong continua meditando regularmente. 
Parece que,  ao constatar a situação de isolamento em que se encontrava junto com os meninos,  passou a ensinar-lhes a meditar.  O objetivo era mantê-los calmos e preservar suas energias enquanto ali estivessem.  Assim se passaram duas semanas. Cada um fazia uma hora de meditação ao dia, e isso os ajudou a resistir durante todo o tempo em que estiveram na caverna até serem encontrados e resgatados. 
Além de ajudar os meninos dando-lhes o que tem de melhor – sua espiritualidade – o treinador deu-lhes vida concreta retirada de sua própria vida. Jejuou e não se alimentou durante os dias de reclusão, a fim de que sobrasse mais dos poucos alimentos de que dispunha o grupo para os meninos.  E foi o último a ser libertado e ver novamente a luz do sol. Certamente seus longos anos de ascese no mosteiro foram fundamentais nessa atitude e nessa prática. 
Neste momento, o alívio e a alegria de ver a todos os personagens da caverna finalmente sãos e salvos, somos levados a refletir sobre a importância da espiritualidade para nossas vidas. 
A rica, admirável e milenar tradição budista pretende conduzir as pessoas em direção à iluminação e à paz de espírito. Poderia ter sido outra tradição.  O importante neste caso é perceber a grandeza de nossa condição humana.  Tão precária e frágil a ponto de contar com forças limitadas para sobreviver em situações difíceis.  Mas tão incrivelmente bela e elevada de forma a enfrentar grandes dificuldades graças ao espírito que anima uma corporeidade finita e mortal. 
O time dos Javalis Selvagens e seu treinador nos sinalizam algo da maior importância.  É preciso cultivar o espírito, investir na vida espiritual, seja em que tradição religiosa for, ou mesmo fora de qualquer uma.  Certamente faz a vida mais digna desse nome.  E pode ajudar-nos muito quando nos virmos isolados em alguma caverna escura e inundada sem vislumbrar saídas evidentes. 
ATIVIDADE:
1. Pesquisar e dialogar sobre o significado de ESPIRITUALIDADE.
2. Dialogar sobre o que significa cultivar o espírito e investir na vida espiritual.
3. Destacar frases e lições de vida que o texto apresenta.

02 julho 2018

66. OS DOIS CELEIROS


Conta-se que dois rapazes moravam na mesma fazenda quando o pai deles faleceu. Um que era solteiro, ficou morando na casa do pai, e o outro, casado, morava numa casa ao lado. Eles tinham uma grande plantação de arroz e um celeiro em comum. Combinaram então de continuar trabalhando juntos, porém, em dividir tudo. Colheram grande quantidade de arroz, metade para um e metade para o outro, e assim decidiram em construir dois celeiros.
Na safra seguinte novamente fizeram uma boa colheita, estavam com os depósitos cheios.
Um dia, no final da tarde, o irmão solteiro começou a achar que aquela divisão não estava certa. Pensava: “Eu sou solteiro e meu irmão é casado, tem mulher e filhos. Ele precisa de mais arroz do que eu, pois eu estou sozinho”. À noite, ele se levantou, foi ao celeiro, pegou uma saca de arroz, e escondido, a colocou no celeiro do irmão.
O irmão casado ao acordar na manhã seguinte também começou a pensar: “Essa divisão não está justa, sou casado, tenho mulher e filhos. E eles vão crescer e poderão me ajudar. Mas meu irmão, ele está sozinho. E se ele não casar, não vai ter ninguém para ajudá-lo. O certo é ele ganhar uma parte a mais do que eu”. Levantou-se, foi ao celeiro, pegou uma saca de arroz e, escondido, a colocou no celeiro do irmão.
E assim foram vivendo. A cada colheita, um levava uma parte a mais para o outro. Só não entendiam porque o estoque não diminuía, sempre ficava a mesma quantidade para cada um.
Uma noite, porém, os dois irmãos se encontraram bem no meio do caminho entre os dois celeiros, cada um com uma saca de arroz nas costas. Um olhou para o outro, colocaram o arroz no chão e se abraçaram.
A partir daquele dia guardaram todas as suas colheitas num único celeiro.
O que esta história nos ensina?
Faz bem a partilha dos nossos dons, dos nossos talentos, enfim, a partilha do que somos e temos. Para quem pensa só em si o que acontece? É preciso fazer com que o bem frutifique e se multiplique através do nosso jeito de ser, de nossas próprias atitudes.

ATIVIDADES:
1. Assinalar palavras importantes do texto e dialogar sobre o significado das mesmas.
2. Como você escreveria ou contaria esta história?
3. Criar uma ilustração (recorte de figuras ou desenhos) sobre a história dos dois celeiros.